Toreador

Não é difícil perceber a razão pela qual se insere, aqui, uma das mais famosas árias do panorama operático --- https://www.youtube.com/watch?v=fOxDzDyLEMQ

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

UM CONSELHEIRO ESTUPEFACIENTE


Excelentíssimo Senhor Juiz-Conselheiro Alfredo José de Sousa

Senhor Conselheiro:

Enganei-me quando lhe chamei modelar, Senhor Conselheiro: V. Ex. é estupefaciente porque o seu comportamento transporta uma série de actos que provocam estupefacção.

Está hoje reformado. Por isso, já não interessa muito apurar se é V. Ex.ª uma dose de estupefaciente em grau que proibisse o consumo. De resto, haverá algum magistrado que prevarique?--- Qual quê! A que propósito se vai censurar um magistrado? É uma classe que não comete deslizes, não erra, nem viola a lei. E o mais curioso de tudo é que, no meio de vós, se encontra quem moteja a Igreja Católica por se considerar infalível, em matérias bem determinadas e cumpridos prévios requisitos. Mas convosco é diferente: sois puros, quase ou mesmo impecáveis.
Todos vemos que assim é. Portanto, não adianta perder mais tempo com isto e o que há a fazer é ir em frente.
Não espero que V. Ex.ª se desculpe pelo facto de ter sido por mim invocado o preceito constitucional ofendido pela norma contida no CPP art. 134.º, n.º 1, al. a) e al. b), contrariamente ao que V. Ex.ª sustentou. Não o espero, com efeito.
Três são as razões:

A primeira está em que, afinal, a omissão de V. Ex.ª que mal fez? Isso de citar a lei, para que serve? São minúcias de diletantes ociosos e sabido é que de minimis non curat praetor.
A segunda prende-se com a certeza de que essa alegação está debaixo dos olhos de toda a gente que ler a petição. Ora V. Ex.ª não é toda a gente: V. Ex.ª é um magistrado.
Por fim, a terceira, que é a mais importante, arranca da minha convicção de que desculpas só as pedem os que têm a grandeza da simplicidade ou, se V. Ex.ª preferir, a simplicidade que apenas a grandeza moral confere. E grandeza desta espécie é predicado que falta a muitos magistrados, em cujo número me parece não ser excessivo incluir V. Ex.ª.
Quanto ao indeferimento da outra petição --- a que versava o direito de o arguido se defender a si prório --- as pretensas razões que V. Ex.ª apresenta formam um discurso tão alheio ao Direito e à simples dialéctica formal, que eu, por uma questão de higiene mental, me limito a poucos e curtos reparos.

«Os magistrados judiciais podem advogar em causa própria (...)» (EMJ art. 19.º), gozando da mesma prerrogativa os que servem no MP (EMP art. 93.º), regime que tanto aqui como ali não procede a qualquer distinção entre processo-crime e processo-cível, pelo que não restringe o direito em função da natureza da lide. Quer dizer, o que a nossa jurisprudência recusa aos próprios advogados, se for criminal o pleito em que surgem como arguidos, é concedido aos magistrados. Ou não estivésseis vós acima das emoções que abalam e das paixões que turbam o ser humano banal. Não esquecemos que sois especiais: uma raça de casta apurada, a quinta-essência do género humano!
Outro argumento que é usado contra o direito de autodefesa --- e fico-me por aqui porque basta de delírio --- é aquele segundo o qual o regime consagrado no PIDCP art. 14.º, n.º 3, al. d) e al. e) e na CEDH art. 6.º, n.º 3, al. c) e al. d),  apenas permite ao arguido defender-se a si próprio ou ter defensor de sua escolha. Poderia ser um bom exercício de análise gramatical, mas nem isso consegue porque aparece deslocado. Na realidade, a partícula ou é realmente uma conjunção alternativa, mas valer-se da disjunção, isso pertence ao arguido e não aos poderes soberanos dos Estados que  contrataram. Ainda que se desse de barato que estaria observado o espírito daqueles diplomas, desde que o direito interno recusasse ao arguido legitimidade para se autodefender, mas lhe concedesse a faculdade de ser assistido por defensor de sua escolha, mesmo assim deve colocar-se a pergunta: Será tanta a inépcia que não se veja que nem isso se pratica em Portugal? Alguém, com um conhecimento mínimo dos problemas e episódios forenses, ignora que  o defensor é nomeado ao arguido,  que o não elege e que tem de o suportar? É crível que esse desconhecimento parta de um magistrado de tão alta hierarquia, o que infelizmente não constitui caso único?
A mim já não me iludais. Todos que se opõem ao direito de o arguido se defender sem advogado, nunca irão aceitar o sentido que guarda o comando dos diplomas que o contêm. Nada que seja de estranhar. Falei em incapacidade e provavelmente o que existe é um propósito bem definido de adulterar as normas sub iudicio. Que interesses obscuros se escondem por trás de tudo isto?
O actual Bastonário da Ordem dos Advogados é, logicamente, profissional do foro. Com ele discorri, aqui em Coimbra, um bom número de vezes acerca deste assunto. Ainda não estava onde hoje se encontra. Portanto, já lá vão alguns anos. Apesar de tudo, lembro-me que manifestou concordância nesta matéria. Subiu àquele lugar e que aconteceu até hoje? --- Nada. Muito fortes devem ser as resistências!
Haja, pois, decoro. E não se proclame afectadamente que a imposição de um patrono ao arguido, ainda que a contragosto dele, realiza uma medida de protecção aos direitos, liberdades e garantias fundamentais do cidadão, porque os factos, na sua nudez, uma nudez fria e agressiva, geram a suspeita de que bem pode ser defesa, sim, mas dos interesses de uma classe. Ou então calai-vos simplesmente, o que será melhor do que soltar vozes enganadoras!
Por este andar, tempo virá no qual se há-de colocar um tampão na boca do arguido, não vá dar-se o caso de ele pôr na conta mais que o devido, quando usar das faculdades previstas no CPP artigos 63.º, n.º 2; 98.º, n.º 1; 141.º, n.º 5; 343.º, n.º 5; 345.º, n.º 1, in fine *. E tudo isto, em nome de quê? Do que havia de ser? Dos sacrossantos princípios de uma doutrina que afirma respeitar o direito à liberdade, tal como já aconteceu num período crítico da nossa história colectiva, quando um príncipe nascido em Portugal e que voluntariamente se desnaturalizou, intimava os Portugueses de então a que não o obrigassem a empregar a força para os libertar! (1)
O grande Jaime Balmes, a respeito dos despropósitos aos quais certamente já todos assistimos, escrevia que era inútil combater os seus autores pela via do raciocínio, porque «(...) quien ha sido capaz de verter un desatino tan completo no es capaz de comprender la fuerza de la impugnación.» (2) Estamos em presença de outro desconchavo. De qualquer maneira entendi que sempre valeria a pena ordenar estas linhas para esclarecimento de terceiros: o universo é imenso, e nele cabe muito mais do que tudo quanto separa  uma dialéctica, até hoje infrutífera, do lugar em que se situam juízos tacanhos, se não forem maldosos!

Joaquim Maria Cymbron
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* Entre os preceitos legais aqui indicados, por lapso não foram referidos estes: 220.º, n.º 2; 222.º, n.º 2 (nalguns casos); e 361.º, n.º 1.
  1. Chronica Constitucional do Porto, n.º 1, 1832, pp.3 e s.
  2. El Criterio, cap. XXII, § IX.

JMC

domingo, 18 de agosto de 2013

UM CONSELHEIRO "MODELAR"


Excelentíssimo Senhor Juiz-Conselheiro Alfredo José de Sousa
 

Senhor Conselheiro:

Há poucos dias, fui surpreendido com um ofício (1) remetido da Provedoria de Justiça, com assinatura de V. Ex.ª. Digo surpreendido, porque não possuo a menor ideia de ter enviado a petição à qual o ofício pretende ser resposta. Estou convicto de que esse documento levou em conta um texto meu publicado neste blogue, imediatamente abaixo das linhas que agora escrevo, e que não devia ser apreciado antes de formalmente apresentado perante V. Ex.ª * É verdade que, num curtíssimo preâmbulo desse texto, eu indico que se trata do conteúdo de uma petição dirigida a essa Provedoria. Foi erro meu: a petição, que remeti nessa data, era cópia de outra submetida à apreciação de V. Ex.ª, relativa ao artigo 64.º do CPP, e que eu imaginava perdida porque não tinha notícias dela.

Já requeri à Provedoria de Justiça que aclare o que para mim não deve passar de uma confusão burocrática. No entanto, é um facto a existência do ofício, como é certo que a condizer substancialmente com tal ofício existe um articulado que preenche, relembro, o anterior texto deste blogue. Por isso, não é prematuro responder já ao que recebi.

O conteúdo e significado deste ofício não me honra, é força confessá-lo. Com efeito, ele reduz-me à mais ínfima insignificância.

Abre V. Ex.ª o harmonioso hino ao Direito que é todo este ofício, declarando que eu não citei nenhuma «regra ou princípio constitucional que considere estar a ser violado.» E diz que isso é concludente, embora sem indicar de quê. Para mim, concludente é que V. Ex.ª não olhou para o artigo 24.º da petição que está no blogue (a única que reconheço como de minha autoria, até prova em contrário). Mas qual a importância de que se reveste isso? Só para um espírito tacanho como o meu é que o disposto no CPP art. 134.º, n.º 1 está viciado de  inconstitucionalidade! Apenas um excesso de rigor comporta a ideia de que a evidência dispensa prova e alegações, se tivesse sido o caso de isso ter faltado (2)!

Saboreei a classificação de testemunho forçado (3). Forçado, Senhor Conselheiro, forçado tenho sido eu e há longuíssimo tempo: forçado a suportar iniquidades clamorosas, praticadas por gente de toda a espécie, e sustentadas por autênticos destemperos de alguns magistrados nas decisões que tomam. É óbvio que V. Ex.ª está fora desta última galeria: seria de uma cruel severidade incluir ali quem produziu tão notável monumento jurídico como é o ofício de que falamos.

Discorre seguidamente V. Ex.ª sobre o fim da norma que confere, às pessoas previstas no CPP art. 134.º, n.º 1, o direito de recusarem depor como testemunhas. E, concretizando, situa a ratio legis no «conflito possível entre os afetos (em geral profundos mas também complexos, numa relação familiar) e a verdade material que se julga acautelar, colocando na esfera individual da (possível) testemunha a decisão sobre a conduta a tomar.» Sublime! Só espíritos muito avaros em prodigar o merecido aplauso poderão deixar de reconhecer que aqui foi V. Ex.ª verdadeiramente genial. Graças ao apurado sentido das proporções requeridas por uma sã administração da Justiça, e também devido a uma correcta avaliação dos sentimentos humanos na família, predicados de que V. Ex.ª anda cheio, fico a saber que a testemunha, eventualmente, se irá debater  num terrível drama afectivo.

Quanto amor se derramará nessa conjuntura! A testemunha  sente-se dilacerada se o que a arrolou é arguido; basta, porém, que quem peça a sua comparência em juízo não seja o arguido, mas sim o assistente, e aí vemos a angústia da testemunha ser ignorada pela lei, que já não lhe consente recusar o depoimento. Portanto, os sentimentos da testemunha oscilam com o que fixa o direito.

Não compreendo esta teoria, que se me afigura assimétrica. Assimetria, numa estrutura que V. Ex.ª apoia com tanto brilho? Que exagero! A culpa há-de caber-me indubitavelmente, pouco bafejado que sou pela fortuna da inteligência. Então eu não enxergo que, se o sujeito processual é arguido, a testemunha sente falar alto a voz do parentesco e, quando o mesmo sujeito é assistente, já se apagam as suaves notas dessa voz? Não alcanço que ir alguém a juízo, para com o seu depoimento contribuir para uma eventual absolvição do parente arguido, será incorrecto se vai a contragosto, mas que já não constitui mal ser-se compelido a testemunhar a favor do parente ofendido? Sou tão desprovido de perspicácia a ponto de entender que condenar um inocente não é mais grave do que quando o tribunal deixa sem satisfação a vítima? Como será possível que eu não veja nenhuma destas coisas?

Apesar de limitadíssimo nas minhas faculdades, gosto de mergulhar na história do nosso direito. O que ali encontrei não foram propriamente  ninharias. Sabe V. Ex.ª? Um desgraçado como eu com pouco se contenta. Por isso, será melhor alinhar o que descobri para que se julgue. Ei-lo:
 
  1. As Ordenações Filipinas dispunham que «o irmão não póde ser testemunha, nem será geralmente perguntado no feito do irmão, por elle, nem contra elle, se o que se dá por testemunha, está debaixo do poderio e governo do irmão por quem, ou contra quem se requerer ser perguntado: ou se o feito em que he dado por testemunha he crime ou civel, em que se trate e mova questão de todos seus bens, ou maior parte delles.» (4) 
  2. Mello Freire apontava os que, em determinadas causas (certis in causis), eram rejeitados como testemunhas: «frater in fratris causa tam criminali, quam civili, magni momenti.» (5)
  3. em plena época do individualismo trazido pela ordem liberal, vemos Pereira e Sousa sustentar que não podem ser testemunhas, por proibição legal relativa, «os irmãos nas Causas dos irmãos quando estão debaixo da sua tutéla, e administração.» (6)
  4. Corrêa Telles também subscreve que «(…) são repellidos de testemunhar», entre outros «o irmão na causa do irmão, se estiver debaixo do poderío e governo d’este; ou se a causa for crime, ou civel, que verse sôbre todos, ou sôbre a maior parte dos bens.» (7)
Neste regresso ao passado, parece líquido que as mais fundas raízes do direito pátrio legislado, a par de doutrina muito autorizada, vão no sentido de não ser absoluta a proibição de os irmãos deporem como testemunhas. Uma hermenêutica, baseada no argumento a contrario sensu, mostraria de forma inequívoca os casos em que essa interdição cessava. E imediatamente esses inábeis passavam a estar sujeitos ao dever geral de testemunhar. São muitos, Senhor Conselheiro! E nem sequer me socorro de que «nas causas entre parentes muitas vezes as melhores testemunhas são os outros parentes» (8) porque as circunstâncias nas quais é meu propósito levar a que tenham lugar os depoimentos, que ferem a sensibilidade de V. Ex.ª, não estão na zona defesa: res inter fratres non sunt! (9) 

 Porquê esta rápida excursão pelo nosso pretérito direito? --- Seria para esperar que V. Ex.ª tivesse compulsado este material e sobre ele discorresse com um fio de lógica, deste modo evitando verter o que críticos venenosos qualificarão de desatino primário no despacho do ofício a que respondo? E, depois disso, admitir até a discordância de V. Ex.ª a respeito da minha posição, o que certamente seria feito com fundamentos carregados de uma riqueza dogmática muito distinta do quadro desolador que V. Ex.ª ofereceu no infeliz despacho que tratamos? Para alguns, aguardar isto de  V. Ex.ª é demasiado: seria o mesmo que contar ouvir uma deliciosa sinfonia composta por quem não é capaz de tirar, das cordas de uma guitarra, mais do que um fado de Lisboa, que é sempre música triste e melodicamente pobre. Mas esses, Senhor Conselheiro, estão repletos de má fé!

Antes de terminar, convido V. Ex.ª a ponderar o que vem estabelecido no CPP art. 402.º, n.º 2, al. b) e al. c). Não sei se valerá de muito. De todas as maneiras, faço-o porque creio cumprir assim um dever de elucidação que há-de aproveitar a alguém. Temos, então, que o estatuído pela lei processual penal (10), nos preceitos que invoco, traz à evidência a estreita conexão que liga as figuras do arguido e do responsável civil, ainda quando o sujeito processual não é o mesmo. Que dizer, pois, se o responsável civil é o arguido e só o arguido, nos casos em que o pedido de indemnização é deduzido em separado?
 
Inclino-me, repito, para que seja nula a eficácia deste apelo. Pelo menos, no ofício sumário que me chegou às mãos, nem palavra a respeito de um possível conflito dentro da mesma causa, gerado pela oposição de decisões sobre a vertente criminal e a vertente civil que houver de tratar, conflito esse que eu assinalei (11). V. Ex.ª dava a impressão de ter uma única preocupação: negar procedência ao que eu alegava contra a faculdade de recusa de depoimento testemunhal por parte dos parentes e afins no 2.º grau da linha colateral. A somar ao clamoroso erro de que omiti a indicação da norma constitucional violada, V. Ex.ª ignora a minha censura sobre o que é, sem sombra de dúvida, o ponto mais vulnerável do regime legal deste instituto.
 
Em tudo quanto desenvolvi na petição, V. Ex.ª não viu mais do que uma violência. Só faltou chamar-lhe inquisitorial. Ficou a perder. Porque nos tempos, que correm, de horizontes rasgados (tão rasgados que tenho dificuldade em ver costura que lhes valha), cai bem essa linguagem. Foi pena, Senhor Conselheiro!
 
 
Joaquim Maria Cymbron
 
 
* Passadas quase três semanas, a Provedoria de Justiça veio finalmente juntar prova de como havia recebido, expedida por mim, a minuta que eu pensava não ter chegado a enviar. Foi, portanto, meu o erro que levou à surpresa manifestada no início deste texto.
    De todos os modos, conforme eu esperava, quanto à questão de fundo nada se altera, pelo que se mantém o conteúdo da resposta ao infeliz e desastrado ofício que teve a assinatura do Ex. mo Conselheiro Alfredo José de Sousa. E a invocação feita no art. 24.º da petição, lá está conforme categoricamente afirmei.
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  1. V. infra.
  2. Na realidade, aqui não estamos verdadeiramente diante de nenhum facto notório, como o define a lei no CPC art. 514.º, n.º 1 e cuja redacção passou à nova versão (art. 412.º, n.º 1). É, porém, sabido que os tribunais julgam sobre a prova produzida. E a prova testemunhal, se não é a mais estimada das provas, constitui por certo uma prova de eleição. De modo que permitir a recusa de depoimento às testemunhas arroladas pelo arguido, tal como o estatui o CPP art. 134.º, n.º 1, al. a) e al. b), é uma limitação abusiva do seu direito à defesa!
  3. O negrito é meu.
  4. Op. cit., Livro 3, Tit. 56, 2, Ed. Cândido Mendes de Almeida, Rio de Janeiro, 1870. O sublinhado é meu. Aqui se reproduz quase ipsis verbis o disposto nas Ordenações Afonsinas (Livro 3, Tit. 51, 13); e nas Ordenações Manuelinas (Livro 3, Tit. 42, 14).
  5. Institutiones Iuris Civilis Lusitani, Lib. IV, Tit. XVII, § II. O sublinhado é meu.
  6. Primeiras linhas sobre o procésso criminal, terceira edição emendada, e accrescentada, Lisboa, 1820, cap. XXVI, § CLXXXV, III. É, afinal, a opinião que ele também defende nas Primeiras linhas sobre o processo civil, n. 477. O sublinhado é meu.
  7. Digesto Portuguez, I, 975, 3.º O sublinhado é meu. Curiosamente, este autor repete, quase ipsis uerbis, o que, a este propósito, estabeleciam as Ordenações Filipinas.
  8. Coelho da Rocha --- Instituições de Direito Civil Portuguez, I, § 184.
  9. Resta acrescentar que a própria lei civil, anterior ao código vigente, não feria os irmãos de incapacidade legal para testemunhar (Código de Seabra, art. 2511.º). Este preceito veio a ser substituído pelo CPC/1939 (art. 624.º). Em 1961, mantém-se o regime no que aos irmãos diz respeito. Pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, este novo código dá-lhe outra configuração, a qual, não obstante uma alteração insignificante operada pelo Decreto-Lei n.º 180/96, de 25 de Setembro, persistiu em linha ininterrupta até se fixar na versão actual (CPC/2013 art. 497.º). Nesta redacção, o regime é o mesmo de sempre, o que logo se vê quando exclui os irmãos de entre os que se podem recusar a depor em juízo, mostrando tal solução ipso facto que a lei não considera esse parentesco causa que os liberte do dever geral de testemunhar. A este argumento da recusa legítima em processo cível, não deixei de aludir na minuta da petição dirigida à Provedoria de Justiça (it. 28.º)
  10. Por lapso, em vez de penal seguiu civil.
  11. Artigos 25.º e ss. do articulado no texto anterior deste blogue.




JMC

quarta-feira, 10 de julho de 2013

RECUSA DE DEPOIMENTO


O texto, que segue, é conteúdo de uma petição individual dirigida à Provedoria de Justiça para os fins que dela constam. (1)


JOAQUIM MARIA BOTELHO DE SOUSA CYMBRON, solteiro, maior,
 
ao abrigo das disposições conjugadas na CRP (art. 23.º, n.º 1; e 52.º, n.º 1),
 
vem pedir a V. Ex.ª que, em virtude da legitimidade que lhe é conferida pela nossa Lei Fundamental (art. 281.º, n.º 2, al. d),
 
requeira a fiscalização abstracta da constitucionalidade respeitante à matéria que consta do seguinte articulado:
 

PETIÇÃO INDIVIDUAL
 
1.º
 
Esta petição visa obter a fiscalização abstracta da constitucionalidade do disposto no CPP art. 134.º, n.º 1, al. a) e al. b).
 
 
MOTIVOS E FUNDAMENTOS:
 
2.º
 
A lei processual penal impõe o dever geral de testemunhar, ressalvando embora algumas excepções (CPP art. 131.º, n.º 1).
 

3.º
 
Algumas delas estão previstas nas duas alíneas do n.º 1 do já referido art. 134.º
 

4.º
 
Esta preocupação do legislador é digna dos maiores encómios.
 

5.º
 
Há realmente casos em que a testemunha pode sentir-se dilacerada por um conflito de deveres e de afectos: ou se mantém fiel à verdade que conhece, o que irá prejudicar o arguido que muito estima; ou para não atraiçoar este, desvia-se da verdade, comportamento que repugna à sua consciência, além de fazê-lo correr o risco de sofrer uma reacção jurídico-penal por ter mentido, bastante suave, é certo, atendendo ao tratamento privilegiado do regime consagrado no CP art. 364.º, al. b), mas de qualquer modo envolvendo condenação.
 

6.º
 
É, como expressivamente dizia José Mourisca, «pôr a testemunha entre Scila e Caribdes (...)» (Código de Processo Penal, II, Vila Nova de Famalicão, Tip. Minerva, 1931, pp. 265 e s.).
 
 
7.º
 
Luís Osório sustenta também a existência do conflito (Comentário ao Código de Processo Penal, III, Coimbra Editora, Lda., 1932, p. 326).
 
 
8.º
 
Situação esta que deve evitar-se tanto quanto isso seja possível.
 
 
9.º
 
No entanto, afigura-se ao ora peticionante que é o arguido o ponto nuclear dos interesses que esta norma visa proteger.
 
10.º
 
Deduz-se do que até aqui foi exposto que o arguido é quem determinou a ratio legis, condicionou a redacção do preceito e inspirou o legislador.
 
 
11.º
 
E, por isso, se deve levar em conta que a possibilidade de recusa em depor, louvável em abstracto e na generalidade, também pode conduzir à inversão da ratio legis.
 
 
12.º
 
Nem sofre discussão que, no quod plerumque accidit, a testemunha bem formada no carácter e de coração limpo, certamente deporá com gosto porque sabe que dela também depende a boa decisão da causa, maxime, quando é julgado alguém que lhe é querido.
 
 
13.º

Porém, também não pode excluir-se que haja pessoas que se encontrem numa das categorias previstas em ambas as normas aqui atacadas de inconstitucionalidade e que invocam o grau de parentesco para se eximirem a depor, por se encontrarem divididas não por um dilema entre dois pólos --- dever de verdade e dever de afecto ---, dilema esse que está cheio de riqueza humana, mas que vivem esse mesmo drama com uma disposição que vai precisamente no sentido oposto ao que a lei quer preservar: se diz a verdade, beneficia o arguido, quando até deseja o contrário; se mente, em princípio o arguido apanha-o melhor que terceiros, dada a ligação íntima que os une e aqui não há lugar à já referida benignidade do CP art. 364.º, al. b).
 
 
14.º
 
É sabido que casos patológicos não constituem regra.
 
 
15.º
 
Mas como existem, sempre que se possa encontrar meio de os prevenir de forma simples e com aquele carácter de generalidade, que tem de acompanhar qualquer norma jurídica, não deve o legislador furtar-se a regular disciplina que evite as consequências desses estados anómalos.
 
 
16.º
 
A verdade é que eles produzem efeitos e bem contrários a um são critério do Direito.
 
 
17.º
 
Ora, se se estipulasse que aqueles com legitimidade para recusar o depoimento, nos termos actuais do previsto no artigo 134.º, n.º 1, al. a) e al. b), não poderiam exercer esse direito se tivessem sido arrolados pelo arguido, parece ao ora peticionante que se teria encontrado solução equitativa para o problema.
 
 
18.º
 
Na verdade, os que se encontram nestas condições de privilégio já não poderiam alegar que lhes dói muito depor, atendendo ao facto de estarem ligados por laços muito fortes ao arguido, e temerem comprometê-lo, ou saberem de antemão que isso vai acontecer infalivelmente, porque tudo quanto pudessem dizer, com verdade, seria desfavorável ao arguido.
 
 
19.º
 
Sendo o arguido o dominus do que mais convém à sua defesa, ao arrolar os que gozam da regalia de poder recusar depor como testemunhas, libertou-os ipso facto desse dever de afecto, pelo que não há violência sobre a sua sensibilidade, no caso de ser autêntico o afecto que dizem nutrir pelo arguido.
 
 
20.º
 
Por outro lado, invocar razões de sentimento para contornar a obrigação geral de testemunhar quando o que subjaz é o comodismo ou, pior, o propósito acintoso de deixar o arguido diminuído na sua defesa, ou até com sérias dificuldades de a levar a cabo (quantas são as vezes em que não há mais ninguém em condições de testemunhar do que os que podem recusar-se a fazê-lo), proceder deste jeito, repise-se, isso não é genuíno sentimento, mas mera simulação de um pieguismo de mau gosto.
 
 
21.º
 
Tal estado de espírito, de modo algum, merece esperar protecção da ordem jurídica.
 
 
22.º
 
E como está a lei, a verdade é que os titulares da faculdade de recusarem depoimento têm cobertura para fugirem a testemunhar, levados por razões que, como acima ficou descrito, nada apresentam de louvável.
 
 
23.º
 
Se for introduzida a ressalva que aqui se peticiona, ficariam essas pessoas sujeitas ao regime geral da obrigatoriedade de testemunhar, sendo deste modo adjuvantes da realização da Justiça, o que afinal devia ser o papel de cada um de nós.
 
 
24.º
 
Mantendo-se o que está em vigor, o arguido vê cerceadas as suas garantias de defesa, com o que se viola a lei fundamental (CRP art. 32.º, n.º 1).
 
 
25.º
 
Há também outra razão de prudência e coerência, a impor novo tratamento destas normas que o ora peticionante considera viciadas de inconstitucionalidade.
 
 
26.º
 
Na verdade, em obediência ao princípio da adesão, «o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei.» (CPP art. 71.º).
 
 
27.º
 
Imaginemos que estamos perante uma das situações contempladas no artigo 72.º do mesmo código e figuremos a seguinte hipótese: o arguido quer construir a sua defesa sobre o depoimento de um ou mais que um irmão ou cunhado.
 
 
28.º
 
Na acção penal não pode servir-se desse meio, por força do expresso num segmento de uma das normas censuradas nesta petição; mas no pedido cível já isso lhe é consentido porque parentesco ou afinidade no segundo grau da linha colateral não são fundamento de recusa a depor (CPC art. 618.º).
 
 
29.º
 
Ambos os julgamentos se realizam: no processo-crime, o arguido sai condenado; no cível, é absolvido da indemnização que contra ele fora pedida com base no facto pelo qual respondeu na acção penal.
 
 
30.º
 
E a prova testemunhal foi decisiva para a absolvição!
 
 
31.º
 
Ora a absolvição do pedido cível ou teve de apoiar-se num juízo de falta de ilicitude, ou então considerou que o R. agiu sem culpa; entretanto, a sentença, no processo-crime onde o R. é arguido, entendeu que havia ilicitude e culpa, pelo que condenou.
 
 
32.º
 
Destas duas sentenças em colisão, esgotam-se os recursos ordinários sem que haja vencimento para qualquer das partes.
 
 
33.º
 

Temos, assim, oposição de acórdãos pois, para chegar a tal resultado, esses acórdãos tiveram de pronunciar-se sobre a mesma questão fundamental de direito --- a ilicitude ou a culpa do arguido, simultaneamente R. --- e fizeram-no em sentidos diferentes.
 
 
34.º
 

Que seja o mesmo ou diferente o diploma legislativo, em que vem tratada a questão de direito que recebeu solução oposta, isso não obsta à oposição que fundamenta recurso para uniformização de jurisprudência, pois no entender do grande Mestre Alberto dos Reis «se a regra, posto que incorporada em ordenamentos jurídicos distintos, deve ter, num e noutro, a mesma significação e o mesmo alcance, estamos no domínio da mesma legislação; (...).» (Código de Processo Civil Anotado, VI, Coimbra Editora, 1985, p. 275).
 
 
35.º
 
E que questão de direito é essa que recebeu solução oposta?
 
 
36.º
 
É obviamente a questão da ilicitude ou da culpa.
 
 
37.º
 
A valer esta posição, tal como a vê o ora peticionante, pergunta-se se este é o caminho para uma maior economia processual.
 
 
38.º
 
O mais chocante de tudo isto é que a ordem jurídica multiplica os seus cuidados de protecção ao arguido, e aqui deixa-o mais inerme do que na posição de R., negando-lhe armas processuais que lhe concede no cível!
 
 
39.º
 
Sendo talvez a ilicitude e a culpa as questões de maior melindre, dentro do direito penal, porque delas depende o julgamento dos factos por mais que, na lei respectiva, estejam tipificados como crimes, até por aqui e para além do assinalado vício de inconstitucionalidade, custa aceitar o regime atacado nesta petição.
 
 
 
Termos em que se espera de V. Ex.ª a decisão de submeter à apreciação do Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da constitucionalidade dos preceitos contidos no CPP art. 134.º, n.º 1, al. a) e al. b), dentro do sentido e do alcance que foi aqui peticionado!
 
 
Joaquim Maria Cymbron
 
________________________________
 
JMC




terça-feira, 16 de abril de 2013

MEIAS 43/46

 
Contrariamente ao que é meu habito, não identifico o processo de que falo. A razão será conhecida mais tarde.
 
P. nnn
XXX
 
 M.ma Juíza de Direito
 
JOAQUIM MARIA BOTELHO DE SOUSA CYMBRON, arguido e condenado nos autos à margem referidos,
 
VEM EXPOR:
 
1.º
As custas processuais ficaram por pagar porque não havia bens desembaraçados.
 
 2.º
 
A prisão subsidiária foi suspensa porque o Tribunal da Relação de XXX julgou justificado o não pagamento da multa, embora tivesse subordinado essa suspensão ao cumprimento de 30 dias de trabalho em serviço de voluntariado.
 3.º
Esse trabalho só começou quando encontraram uma instituição particular de solidariedade social, onde o condenado iria realizá-lo, depois de se ter negado a fazê-lo em organismos do Estado.

 4.º
 
Os 30 dias de trabalho foram convertidos em 240 horas, das quais o condenado só cumpriu 176 horas por entender que estava preenchido o mínimo que o dispensava de prisão subsidiária.

 5.º
Ao fim de muita controvérsia, em que novamente se falou de cumprimento de prisão subsidiária, prisão que o condenado não temia, foi decretada a extinção da pena.
 
 
CONCLUSÕES:
  1. Custas não pagas!
  2. Multa não paga!
  3. Decisão de prisão subsidiária substituída por serviço de voluntariado!
  4. Trabalho em instituições do Estado recusado pelo condenado!
  5. Tempo de trabalho realizado onde foi vontade do condenado efectuá-lo, e que este reduziu motu proprio de 240 para 176 horas!
  6. Alguma bulha desse lado, e prisão subsidiária volta a estar iminente!
  7. Pena finalmente declarada extinta!
 
Termos em que se envia um par de meias para compensar a larguíssima metade que o condenado não cumpriu: uma das meias é presente que ele faz a V. Ex.ª, Senhora Dr.ª XXX, que só não o mandou para a forca porque tal pena já não existe; a outra tem por beneficiária a queixosa nos autos, não contente com as sucessivas prevaricações cometidas em prejuízo do condenado!
 
JUNTA: Um par de meias.
Joaquim Maria Cymbron

segunda-feira, 11 de março de 2013

A LIÇÃO DO TERREIRO DO PAÇO





Qualquer casa, desde que tenha espaço suficiente, guarda sempre um recanto a que os donos dedicam especial cuidado, e se esmeram por lhe dar um aspecto mais convidativo do que ao restante da habitação.
A nossa capital construiu o Terreiro do Paço em priscas eras e reergueu-o dos escombros de um terramoto; enfeitou-o; e ali  tem o seu salão nobre. Quanto a mim, foi escolha acertada.
É associado ao poder político. Falar do Terreiro do Paço soa a mando. Embora não se verifique, nos dias que correm, uma correspondência absoluta entre os dois, o facto é que a inércia da linguagem pesa alguma coisa e a assimilação continua. Convenhamos que não é inapropriada, pois o Estado continua bem representado naquele lugar.
Alguns chamam-lhe Praça do Comércio. Sempre preferi a designação histórica. Mas hoje é mesmo a Praça do Comércio, porque é reflexo de comércio no pior sentido da palavra, comércio da falta de honra e de pudor, comércio de carne humana como é espelho fiel a que se estende no chão e se torna visível na imagem que encima este texto.
 
E a infâmia não é só dos políticos. Debaixo destas mesmas arcadas, abre-se a porta para o mais alto expoente de um órgão de soberania --- o Supremo Tribunal de Justiça. De Justiça, tem pelo menos o nome; se o merece ou não, que o diga gente como os incontáveis desgraçados que se arrastam pelas ruas sobrevivendo do jeito que a imagem mostra. Os outros tribunais não se afastam deste padrão, e consequentemente transportam idêntico grau de responsabilidade que só admite gradação em função da hierarquia de cada um.
 
Todos os deserdados da fortuna, que tiveram de procurar leito em cima daquelas frias lajes, terão a sua história. Naquele sítio e em tantos outros parecidos, onde o infortúnio se repete. A causa desta miséria não será igual em todos, mas uma coisa é certa: alguns quadros como este têm origem em decisões judiciais que por vezes não passam de clamorosos erros de direito, e  que noutros casos, nada raros, foram ditadas por um propósito criminoso. Contudo, pelos crimes previstos e punidos no artigo 369.º do Código Penal, não se conhece nos anais judiciários uma única condenação!
 
Sei, por experiência própria, para onde nos pode atirar o desconcerto dos tribunais. Trago no corpo e na alma, cicatrizes profundas desse desvairo.
 
Por ora, os magistrados denunciados pela prática dos crimes de prevaricação ou de denegação de justiça nada sofreram, porque (assim considera quem os julga) agiram sem consciência de que procediam contra a lei. É jurisprudência constante. Saber que a nossa fazenda, a nossa liberdade ou a nossa honra estão nas mãos de inconscientes não é mais tranquilizador do que se nos atirassem para um covil de malfeitores ou nos deixassem nas garras afiadas de ferozes animais.
 
Na judicatura, a incompetência pode até ser mais perigosa do que a malícia. Assim como não há santo que nunca peque, também não se conhece malvado que não seja tocado por uns momentos de bondade. Pelo que o julgamento levado a cabo por um magistrado imoral pode ser justo, quando as partes tiveram a sorte de se cruzarem com ele numa das suas horas de graça; em contrapartida, só um produto do acaso permitirá que de magistrado inepto brote uma decisão recta.
 
Portanto, o mínimo que se espera é um padrão de responsabilidade. Se alguém há desta casta de impecáveis que não tenha consciência de que viola a lei, quando lavra despacho ou sentença em manifesta contradição ao que estipula o direito, esse magistrado que se retire ou demitam-no; e se age maldosamente, que seja punido conforme o estabelecido no Código Penal. Com isto, só sairia reforçado o prestígio da Justiça.
 
Estando enferma toda a sociedade portuguesa, o nexo causa – efeito deste morbo colectivo não se estabelece numa única relação linear e com um só sentido: a acção é múltipla, complexa e recíproca. Há contudo três cancros que nos roem de forma mais letal: a Comunicação Social, canal bestificante; a Banca, fonte inesgotável de corrupção e mistificação; vêm por fim os magistrados, esquecidos do espírito que anima a nobilíssima função que são chamados a exercer. Por definição, os tribunais constituem a garantia das liberdades consagradas na ordem jurídica. Desta maneira, são o derradeiro paládio antes do recurso à força, solução indesejável, mas a que não se consegue fugir quando um povo quer continuar o seu caminho.
 
O poder judicial é a jóia da soberania e como tal devia luzir. Pedir que os tribunais brilhem, não é portanto pedir demais. Infelizmente, eu entendo, pelas razões já invocadas, que eles se transformaram nos principais culpados da anomia que alastra. E, claro, à sombra dessa anomia vai crescendo a miséria de que é expressivo argumento o que o Terreiro do Paço nos revela.
 
Dantes podíamos afirmar com fundamento: há magistrados que não dignificam a beca que envergam; hoje, a honestidade impõe que se diga: há magistrados que são íntegros. A diferença é só uma, mas imensa como a distância que vai da honradez à venalidade!

Joaquim Maria Cymbron