Toreador

Não é difícil perceber a razão pela qual se insere, aqui, uma das mais famosas árias do panorama operático --- https://www.youtube.com/watch?v=fOxDzDyLEMQ

terça-feira, 6 de novembro de 2012

DESEMBARGADORES?

 
 
Venerando Desembargador
Veneranda Desembargadora
 
 
O tratamento de Venerando e de Veneranda, que pode ler-se nesta peça, deve entender-se como resultado de mera etiqueta institucional porque, da minha parte, de modo nenhum traduz o que normalmente significa.
 
O hábito de lidar com alguns magistrados cria imunidade a patologias do foro mental. Como o psiquiatra foge a disputar com o paciente para não ser enleado pelo seu discurso febril, já que delírio não é dialéctica, assim deve comportar-se quem é castigado por algumas sentenças judiciais --- contestar quanto baste para luz de terceiros e nunca para convencer os alienados que as proferiram.
 
Se não é um caso clínico, encontramo-nos então diante de uma pérfida monstruosidade. Perturbação do juízo ou malícia, importa que fique esta interrogação: Desembargadores, vós? --- Equívoco descomunal: só por desmesurada ironia pode alguém dispensar-vos título de tamanha responsabilidade e dignidade, se acaso não sois vós que o usurpais com refinado cinismo!
 
Do vosso acórdão (para lhe dar um nome), podia ter recorrido para o Tribunal Constitucional. Mas ali, quando a questão é incómoda, os Senhores Conselheiros, com expedientes nem sempre os mais válidos, arranjam modo de não tomar conhecimento do objecto do recurso. Tinha ainda fundamento para ir até ao Supremo, requerendo fixação de jurisprudência. Porém, também aqui nada me tira da certeza de que o esforço seria vão. De resto, entre os dois acórdãos opostos, não me interessou submeter à apreciação daquele Tribunal que decidisse qual deles devia prevalecer. O melhor teria sido rifá-los: o primeiro a sair, resolveria o conflito criado!
 
Por tudo isto, achei melhor ficar quieto. Quieto perante certas instâncias que já não colhem nem o meu crédito nem o meu respeito. No mais, continuarei a reagir proclamando bem alto o mísero estado a que alguns magistrados reduziram a Justiça neste desgraçado Portugal. Denuncio o mal e provo-o as vezes que me pedirem. Só não vê isso quem foi atacado de demência, ou então os que estão possessos de ruindade e se revolvem nas chamas do ódio.
 
Entre a população portuguesa, é cada vez maior o cepticismo relativamente aos Tribunais. Venho insistindo na nota de que a sociedade está gravemente enferma. Não há mal que não mostre. No entanto, são três os principais cancros que a roem: a Comunicação Social, que tudo distorce e envenena; a Banca, fonte pródiga de corrupção; e bom número de magistrados judiciais, desse grémio que esperávamos remédio e salvação da res publica, mas onde, por desventura nossa, campeiam os que se revelam incapazes de actuar. Isto quando não procedem acintosamente contra a recta ordenação do Direito, sinal da avariose instalada numa jurisprudência que há muito virou costas à ars boni et aequi.
 
De Josué a Saul, os Juízes foram os chefes do povo eleito, dotados de grande carisma e suscitados por Deus nos momentos críticos da vida de Israel. Ao longo dos tempos e em todas as culturas, sempre foi sentida a necessidade de figuras de referência e de autoridade no governo, duas coisas que hoje escasseiam ou faltam de todo.
 
As funções daqueles heróis bíblicos não eram propriamente as mesmas que estamos habituados a ver nos modernos juízes. Mas nem só nisso se distinguem. A diferença principal reside no contraste entre uns e outros, marcado pelo valor e aceitação dos primeiros, em oposição aos últimos, os quais, salvo raras excepções, são fracos em qualidade e pouco ou já nada colhem da consideração social.
 
Senhor Desembargador e Senhora Desembargadora!
 
Cada vez fica mais a nu aquilo que sois e há muito eu sabia. Tanto despautério só pode transpirar de quem pertence a seitas ocultas, ou por qualquer outra via se acha dependente dos que adoram nas aras sacrílegas desses antros de perdição. Haveis de morrer sufocados na raiva infernal que destilais!
 
Os Tribunais já não têm poder de censura uns sobre os outros, segundo a disposição hierárquica que nos acostumámos a ver observada e que, formalmente, continua em vigor. Desde há bastante tempo que as regras são composições e arranjos, de acordo com o ditado pela obediência a uma voz discricionária, nascida nem os seus executantes sabem onde, mas que é cegamente cumprida.
 
Pertenceis ao Tribunal de uma Relação. Relação de quê ou a quê? Relação de Justiça ou aos seus princípios não será certamente, porque o pretenso acórdão que lavrastes, se não foi a mais rematada maldade, é um arremedo de jurisprudência e, como tal, não deve ser levado a sério. Talvez se situe na hipótese de farsa inoportuna a resposta que se encontra mais perto de explicar tanto desconchavo, porque não é de excluir que sejais aquilo em que, para dar título a uma das suas obras, Jean-Paul Sartre provavelmente se teria inspirado, se vos houvera conhecido.
 
Perversos ou simplesmente ineptos, não vos tenho ódio, nem vos guardo rancor. Da indignação que já senti, passei ao desprezo. É tudo o que mereceis!
 
Convosco não se pode discorrer juridicamente, porque não cultivais a ciência do Direito. Se quero crescer neste ramo do saber, bato à porta dos Oficiais de Justiça: são mais instruídos, e sobretudo tive quase sempre a felicidade de me cruzar com gente de boa fé. Fora disto, é o deserto com alguns oásis semeados aqui e além, e muitas miragens pelo meio!
 
Joaquim Maria Cymbron
 
________________ 
Obs.: Este texto tem como fundamento próximo o recurso penal que subiu ao TRC, e que foi interposto no P. 404/09.3 TARGR. O acórdão nele proferido constituiu as fls. 532 e ss. daqueles autos.
 
JMC

terça-feira, 16 de outubro de 2012

O MOSTRENGO DOS AÇORES


Os versos, que seguem, são dedicados à M.ma Juíza exercendo funções no Tribunal Judicial da Ribeira Grande (2.º Juízo), em agradecimento à possível prisão que virei a sofrer, consequência da sua sanha persecutória. Estou-lhe grato por me dar oportunidade de passar algum tempo vivendo dos dinheiros públicos, o que faço de consciência absolutamente tranquila, porque desde há muito vem o Estado locupletando-se à minha custa em sucessivos esbulhos!



O Mostrengo, que está no meio do mar,
Não chega a voar na noite de breu.
O Mostrengo, perdido numas ilhas de bruma,
De feio que é, cobre-se com a noite.

Não voa, não sabe mais que chiar,
Assim é a língua de quem é Mostrengo.
Desesperado procura, e não consegue,
Levar o medo onde a sua sombra toca.

Atónito, pergunta: «Que ousadia é esta
De pôr em causa o meu chiar?
Quem é aquele vulto que não me teme
E levanta a bandeira da reacção?»

Na sua estatura imunda e grossa,
O Mostrengo esqueceu que não basta chiar.
É preciso razão, não pode faltar
Para que haja Direito no que se faz!



Joaquim Maria Cymbron

terça-feira, 24 de julho de 2012

NVLLA POENA SINE IVDICIO


Assim devia ser, mas nem sempre é.
O que abaixo segue é tão desconforme à moral, ao direito, à lógica e até ao mais elementar senso comum, que se não é um caso insólito, pelo menos há-de ser raríssimo E se me engano nesta previsão, então a Magistratura Portuguesa está muito pior do que se diz e eu próprio imaginava.
Só de uma mente e vontade sobre as quais prefiro não me pronunciar, só delas, repito, pode sair desconchavo semelhante ao que vou narrar. A sua autora é a M.ma Juíza de Direito, exercendo funções no 4.º Juízo Criminal da Vara de Competência Mista e Juízos Criminais de Coimbra. E o processo, de que trato aqui, leva o n.º 404/09.3TARGR.
Nele, o condenado fui eu!


O título convida a esta interrogação: mas foi decretada alguma pena sem que eu fosse julgado? 

A pergunta envolve dois aspectos, pelo que a resposta também se há-de desdobrar. E assim temos que houve pena, embora ainda não transitada em julgado (1). Quanto ao resto, direi que o que se passou naquele Tribunal não merece o nome de julgamento: foi uma execução sumária, que nem sequer vale um número de circo, porque muitas vezes os palhaços têm a sua graça.
 
Com efeito, criminoso é todo aquele que foi condenado pela prática de um facto que a lei prevê e pune como crime. Mas para ser julgado, tratando-se de crime público, como é o caso de que aqui dou notícia, tem de haver antes um impulso do MP contra o agente do facto punível, requerendo que ele seja presente a juízo. E essa promoção só tem lugar contra a pessoa do arguido.

Ora ninguém nasce arguido: tem de ser constituído como tal, quando é ocasião. E então depois já está em condições de enfrentar uma acção penal.

Não o entendeu assim a M.ma Juíza de Direito e, por isso, não hesitou em condenar-me pela prática de um alegado crime, do qual não chegaram a constituir-me arguido.

Por conseguinte, nenhum inquérito se realizou, vício que gera nulidade insanável, do número daquelas «que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, (...)» (CPP art. 119.º, al. d). A este conhecimento ex officio, juntei a minha voz nos autos (fls. 70 e s.) e na própria audiência de julgamento. Sobre isto, a Ex.ma Magistrada não emitiu qualquer juízo. Ignorou, pois, o que por lei era obrigada a conhecer; e fez orelhas moucas ao que eu aleguei na contestação e disse no julgamento. A culpa disto cabe-lhe por inteiro e a conclusão a tirar é que prevaricou duplamente.

E qual foi o alegado crime em que a M.ma Juíza me condenou, não obstante a flagrante nulidade já assinalada? Nem mais, nem menos que um do mesmo tipo legal, por cuja prática me absolvera oito meses antes. 

Há provas? Estão na sentença que ela então proferiu e de que se extraem as passagens  que importam à demonstração:


Proc. n.º 475/09.2TARGR
 

(...).


FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Da audiência de discussão e julgamento resultou como provada a seguinte matéria:

  1. Nos dias 25 de Janeiro de 2008 e 4 de Março de 2010, na Esquadra de Investigação Criminal, em Coimbra, no âmbito dos Inquéritos n.º 1112/07.5TAPDL e 475/09.2TARGR, o arguido prestou declarações na qualidade de arguido.
  2. Nas duas ocasiões foi advertido pelos agentes policiais que procediam aos interrogatórios de que a falta, ou a falsidade, de resposta sobre os seus antecedentes criminais o faria incorrer em responsabilidade penal.
  3. Não obstante tal advertência, o arguido, em 25 de Janeiro de 2008 e 4 de Março de 2010, recusou indicar aos agentes que procediam ao interrogatório os seus antecedentes criminais, dizendo que não respondia a tal pergunta por considerar inconstitucional a norma que o obriga a responder aos seus antecedentes criminais.

(...).

****

FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA PROVADA
 

Os factos dados como provados assentam, essencialmente, das declarações do arguido que admitiu que os mesmos eram verdadeiros, na certidão junta aos autos a fls. 1 a 25, do teor de fls. 35 e certificado de registo criminal de fls. 42 a 44. 

Consideramos como não provados os demais factos, por o arguido ter explicado por que razão defende que a norma que obriga a que os arguidos respondam quanto aos seus antecedentes criminais é inconstitucional. Além disso, o próprio tribunal considera que a conduta descrita não integra a prática de um crime, pelo que nunca poderia ser dado como provado que o arguido sabia que praticava actos criminalmente puníveis.

(...).

Resta tão só esclarecer que a conduta do arguido descrita na acusação também não integra o crime de desobediência, pp. no artigo 348.° do Código Penal, pois não estabelecendo a lei processual penal a cominação pelo crime de desobediência para o arguido que recuse responder aos seus antecedentes criminais, era necessário que o arguido tivesse sido advertido que incorria em crime de desobediência - artigo 348.°, n.º 1, alínea b) do Código Penal. Com efeito, não basta advertir o arguido que, a recusa, o faz incorrer em responsabilidade criminal, é necessário que ele tome conhecimento do concreto crime em que incorre, ou seja, que comete um crime de desobediência - neste sentido, entre outros, AC. R. G. de 10.01.2005, e Ac. R. P. de 03.12.2003, in www.dgsi.pt.
 
*

DISPOSITIVO

Face a todo o anteriormente exposto, absolvo o arguido Joaquim Maria Botelho de Sousa Cymbron dos crimes por que vinha acusado.  

*

 Sem custas.


Notifique e proceda a depósito.

*

(Processado em computador e integralmente revisto pela signatária - artigo 94.°, n.º 2 do Código de Processo Penal).

*

Coimbra, 12 de Abril de 2011
 
Penso que basta. Absolve-me, neste processo, porque aceita as razões que me levaram a não responder à pergunta sobre os antecedentes criminais; além disso, considera que nem chegou a haver desobediência por falta dos elementos constitutivos daquele tipo legal de crime; e remete para jurisprudência de tribunais superiores que sustentam o mesmo que foi decidido por ela quanto a mim.

Uns meses mais tarde, foi o que se viu!

 
Joaquim Maria Cymbron

____________________________________________

  1. Subiu à Relação e ali perdi. Para lá do dissabor que sempre é perder um recurso, o mais chocante foi o argumento usado naquele Tribunal (fls. 540 e s.), para afastar a invocada nulidade insanável, que serviu de cabeçalho a esta peça do blogue. O curso do raciocínio --- se assim se lhe pode chamar --- seguido pelo acórdão da Relação levou-me a felicitar os seus autores.

JMC

domingo, 18 de março de 2012

UMA TÉCNICA SEM TÉCNICA


Uma Juíza de Direito, que foge a todos os padrões do que se reputa ética e psicologicamente normal, deve sentir bem o amargor de não ter conseguido a minha prisão. Em vez disso, acabei por ir prestar trabalho a favor da comunidade numa instituição de solidariedade social de direito privado, porque me recusei a fazê-lo em organismos públicos, uma vez que esbulhado pelo Estado já fui o suficiente.

Conforme eu esperava, a experiência tem sido enriquecedora. O trabalho é levado a cabo numa quinta, o que me tem proporcionado travar conhecimento com realidades que sempre ambicionei tratar de perto. E há sobretudo o lado humano: é um grupo heterogéneo, aspecto que o torna particularmente interessante.

Sente-se que todos têm o seu drama pessoal; alguns espontaneamente abriram-se comigo e fizeram-me confidências; não outros, e obviamente também nada lhes perguntei, embora seja visível que guardam uma história de vida para contar.

Num ambiente, ao mesmo tempo delicado e apaixonante, onde vão cair pessoas das mais diversas origens e por causas bem distintas, tem esta instituição ao seu serviço uma mulher de grande riqueza interior e que sabe repartir e orientar as tarefas que cada um tem a desempenhar.
 
Mas a técnica da DGRS que me calhou na rifa, dona do processo que será enviado a Tribunal com notícia do meu comportamento, é a negação do que exige a sua função. Com efeito, esta técnica carece da mais elementar estrutura psicológica para o exercício de cargo rodeado de tanto melindre. Muito provavelmente, achou-se aqui como quem se refugia numa fortaleza para se proteger dos ressentimentos que a sorte lhe atirou para cima.

É baixa a sua extracção social. Isto que, in se, nada tem de censurável, assenhoreou-se dela e marcou-a profundamente. Em lugar de aprender a subir --- o que só seria louvável --- deu-lhe para o que sucede na maioria destes casos: procurou a rasoira da igualdade na escala zero, que foi aquela onde nasceu, a que se habituou e de que nunca conseguiu afastar-se.

Definidos estes pontos, sinceramente não descortino como pode alguém receber lições de ressocialização da parte de uma personagem, à qual falta a mais pequena ponta de fineza. E, por fineza, pretendo aludir à fineza de espírito e não que esta técnica de reinserção social revele boas maneiras. Isso caía bem, mas seria exigir demasiado. De resto, convém não confundir boas maneiras com boa educação. A boa educação, que nem sempre tem a ver com o acaso do nascimento, é bastante mais importante, e é principamente a falta desta que reprovo naquela técnica.

Concluindo, declaro não reconhecer idoneidade à técnica, aqui visada, para ressocializar seja quem for, o que automaticamente me coloca fora da sua catequese.



Joaquim Maria Cymbron



Obs.: A técnica aqui referida chama-se Maria Belarmina N. Xavier. 

sexta-feira, 2 de março de 2012

UMA DECEPÇÃO


Há muito que defendo as forças de segurança deste tão desgraçado país. Fi-lo sempre com intensidade e cheio de convicção: considero que os seus elementos têm vocação de mártires.

Movem-se num apertado círculo de sacrifício e incompreensão: o que a sua missão importa em sacrifício é tão visível que nem adianta demonstrá-lo, porque quem não for capaz de o reconhecer também não aceitará a prova do que sustento; e pior que a hostilidade, que tantas vezes as atinge, é serem ignoradas. Por isso, repito que sofrem o duplo aperto de um duríssimo aro de ferro.

Infelizmente, há sempre quem destoa. Desta vez, ao contrário do que é meu hábito, não identifico quem censuro, porque o seu comportamento ocorreu num processo penal que ainda está no começo. E apesar de já não existir segredo de justiça fora dos casos concretamente decretados por juiz de instrução, a verdade é que eu tenho as minhas regras e não me parece curial revelar mais dados do que os que aqui deixo.

Limito-me, pois, a dizer que é autora do comportamento por mim reprovado uma inspectora da Polícia Judiciária. O facto por ela praticado --- um pretenso relatório da investigação que levou a cabo a brigada de que faz parte --- excede os limites do concebível.

Graças a Deus, a senhora inspectora há-de depor em julgamento. Logo aí deve surgir mais para contar, em princípio acompanhado já da respectiva fundamentação. Virá depois a sentença até que se forme caso julgado. Então se saberá o que faltar!



Joaquim Maria Cymbron

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

JUIZ?

(Publicado há umas horas neste espaço digital)
  1. Só agora vi o comentário de Zeka Bumba ao que escrevi sobre Baltasar Garzón.
  2. Zeka Bumba tem-se apresentado como Juiz de Direito.
  3. Não cuido do mérito ou demérito do conteúdo do seu comentário.
  4. Limito-me a dizer (eu, que tão crítico sou dos maus magistrados), fico-me, repito, por deixar aqui exarado o seguinte:
  5. Não compreendo, nem me parece que algum dia venha a compreender, como é possível um Juiz de Direito descer à praça pública a discutir seja o que for.
  6. Um Juiz de Direito, como eu o vejo, é titular de um órgão do poder político, precisamente aquele que constitui a jóia da soberania, tão estimado que os próprios Reis nunca abriram mão dele por completo, reservando sempre para si o direito de clemência.
  7. Entrando em debates com o vulgo, o mínimo que lhe pode acontecer é vulgarizar-se.
  8. Mas os juízes, como homens que são, não têm direitos iguais aos demais cidadãos?
  9. Na pureza do seu enunciado abstracto, é evidente que sim, mas alguns desses direitos só os podem gozar com muita prudência.
  10. Quem, um dia, voluntariamente escolheu a grandeza desta profissão (que, a ser exercida com nobreza, é uma das mais duras servidões a que um ser humano se pode sujeitar) também livremente renunciou a alguns direitos, pelo menos, na sua total extensão.
  11. O Juiz de Direito é o sacerdote que perscruta os arcanos da lei e profere o respectivo oráculo.
  12. Se deixa de aparecer como uma figura hierática, perde prestígio e, sem ele, esfuma-se o seu poder.
  13. Talvez por pensar assim, sejam frequentes e acesas as minhas fricções com certos magistrados.
  14. E certamente por isto, digo ao meu opositor que pode acumular os comentários que quiser que nenhuma resposta minha há-de receber.
  15. Ele ou qualquer outro Juiz de Direito!

Joaquim Maria Cymbron

sábado, 14 de janeiro de 2012

PROMOÇÃO DE ENTREMEZ


P. 201/05.5 TAPDL
2.º Juízo
Tribunal Judicial da Ribeira Grande
Ex.mo Procurador-Adjunto da República


JOAQUIM MARIA BOTELHO DE SOUSA CYMBRON, condenado no processo à margem, 

VEM DIZER:

  1. O pudor obrigaria V. Ex.ª a pedir escusa de continuar a intervir nos presentes autos, por imposição do disposto no CPP art. 43.º, n.º 1, aplicável ex vi CPP art. 54.º, n.º 1.
  2. Isto é de tal forma claro e de tão elementar justiça que (imagine-se só!), até a M.ma Juíza, titular do Juízo onde V. Ex.ª presta funções, o fez.
  3. Além de falta de pudor, é perceptível uma total ausência de brio no comportamento de V. Ex.ª
  4. Com efeito, a 11DEC09, queixou-se V. Ex.ª do condenado, dando assim origem ao P. 494/09.9 TARGR.
  5. Este processo veio a ser apenso ao P. 474/09.4 TARGR, e ambos vieram a percorrer um trajecto lastimoso,  recentemente descrito neste blogue.
  6. Aí, assumiu V. Ex.ª um papel altamente desonroso.
  7. Não dirá o condenado que V. Ex.ª saiu despropositamente de cena, porque esse episódio teve um objectivo bem definido.
  8. Deste modo, permitiu V. Ex.ª que o seu Ex.mo Colega, depois de falhada a tentativa de colocar os autos em Coimbra, e fechada a saída para o problema com a oposição do aqui condenado a uma desistência de queixa ad hoc, por parte da M.ma Juíza causadora de todo este bulício, que esse seu Colega, repita-se, descobrisse que não tinha havido crime contra a honra daquela magistrada, servindo-se para esta conclusão do texto que o condenado dirigira a V. Ex.ª
  9. Parece inventado, mas não é!
  10. Tudo o que aqui se diz vem minuciosa e escrupulosamente narrado, onde acima já se indicou.
  11. Vem agora V. Ex.ª, de férula em punho, promover que o condenado cumpra prisão subsidiária (fls. 761 dos autos).
  12. Passe os olhos sobre o que escrevi há um par de dias, e veja V. Ex.ª o caso que faço da prisão para onde entende que devo ir.
  13. Senhor Procurador! Est modus in rebus, já dizia o velho Horácio.
  14. Já que não dignifica o que institucionalmente representa, ao menos dê provas de inteligência.
  15.  E fique sabendo que eu, quando quero ver um número divertido, vou ao circo!

Joaquim Maria Cymbron

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A ORDEM

A contumácia é grande; o despudor continua; e a malvadez não mostra limites. Mas a minha indignação é maior que toda esta ignomínia junta; ainda não quebrei; e, com a ajuda de Deus, espero que o meu ânimo não há-de esmorecer.


Sem disciplina, a vida é impossível. Os movimentos revolucionários estimam-na tanto que a exigem e a impõem nas suas hostes. Como o oxigénio para o fogo, assim está a disciplina para todos os comportamentos humanos, mesmo os mais sediciosos: onde ela falte, as chamas da subversão não podem arder. Isto diz bem do alto valor da disciplina, que até os inimigos da ordem a apetecem e põem em prática.

Quando digo ordem, não me refiro àquelas manifestações de ordem, que se substituem umas às outras, com uma facilidade quase igual ao programa de qualquer feira e que não chega a criar raízes: tenho em vista a ordem recta e justa, a ordem que dura e perdura, porque permanece no Ser. Só devia aspirar à dignidade de ordem, aquela que assenta as suas bases na lei divina, porque é a única cuja intrínseca bondade lhe confere vocação de perpetuidade.

A mais falsa aparência de ordem, tão intensa que se lhe pode chamar inversão da ordem, é aquela que se vê no domínio da tirania. Esta assume dois aspectos: um, é o sistema que garante o bem privado do princeps, em detrimento do que diz respeito a toda a comunidade; o outro está no exercício pervertido do poder político através de grupos privilegiados, que, a coberto da escolha de multidões anónimas, vão sacando todas as vantagens da res publica, com exclusão dos demais. Não há mais nem menos violência em qualquer uma destas formas de governo. E se a definição clássica tem o mau hábito de só chamar tirania à primeira delas, nem por isso há menos opressão na segunda, para a qual se convencionou reservar o nome de oligarquia. A terminologia, aqui, acomoda-se à mera questão de singularidade ou pluralidade dos favorecidos com a iniquidade que levam a cabo.

A pior das tiranias, no entanto, é sempre a que resulta da anarquia. Esta declara-se todas as vezes que as instituições públicas se mostram incapazes de fazer observar as leis que elas próprias criam. Nem interessará, então, cuidar do valor ético das mesmas; basta que se dê o vazio de poder. Para essa situação caminhamos a passos acelerados. A partir desse momento, tudo pode acontecer: entra-se em estado de revolta e não deve admirar que estale a rebelião, movimento ditado por um instinto colectivo de sobrevivência.

E é por isto mesmo que quem diz sociedade, diz ordem, mesmo que não seja uma ordem justa. Pois sociedade sem ordem não se concebe, nem o nome de sociedade se lhe pode dar: não passa de uma horda à solta.

Como acima disse, vivemos um estado vizinho da anarquia. Os principais agentes subversores da ordem, daquela que temos, em certos pontos prolixa, contraditória e sobretudo privada do selo da integridade, mas apesar de tudo ordem, porque mesmo combalida por aqueles males ainda é formada de regras portadoras de valores positivos, os maiores culpados da anomia que se aproxima, repito, encontram-se no meio de duas legiões, autênticos demónios do mal, competindo entre si na tarefa de destruição. Refiro-me a algumas figuras das magistraturas dos nossos Tribunais.

Alegam que a responsabilidade da grave situação criada cabe ao legislador. Já não é mau: ficamos assim a saber que as coisas não estão boas. Simplesmente, a defesa é improcedente e envergonha quem a ela recorre:

Se é certo que o legislador faz a lei, quem a aplica são os Tribunais. Se a lei requer ser depurada, aqueles órgãos têm legitimidade bastante para proceder a uma epiqueia da mesma. Se o não fazem, andam mal porque têm não só o poder, como também o dever de agir por este modo.

Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Sociais Prisionais! Isto que é? Que significado tem este título tão comprido? Fixemo-nos nas primeiras palavras: Direcção-Geral de Reinserção. Reinserir como, quem e para quê? É sensato promover a reinserção daquele que nunca deixou de estar inserido? Impõe-se distinguir entre sistemas: quando alguém está integrado num sistema de ordem, da autêntica ordem, é acaso lícito, sob a capa da reinserção, desviá-lo para um sistema de moral abjecta e com leis de escassíssimo crédito? No entanto, é para ali que os nossos magistrados empurram os condenados, esquecendo que nem todos acharão vantajosa a troca com um sistema de traição, de desonra e de dor, sistema que, pouco a pouco, destrói a consciência nacional de um povo e, fibra a fibra, rasga a sua identidade histórica.

Querem que eu vá reinserir-me no tecido social. Porquê? Há por aí tanta marginalidade, e não vejo com ela a mesma preocupação.

Ainda recentemente, a opinião pública estremeceu debaixo da impressão causada pelas denúncias de plágio nuns exames efectuados no CEJ. E mais atónita ficou, quando soube da solução dada ao caso. Não tem razão. Exigir a punição dos que copiaram, é sintoma de um temperamento mórbido. Se os magistrados, já com anos de serviço e em funções, até hoje passaram impunes sempre que prevaricaram ou denegaram justiça, porque – assim se vem decidindo – não foi conscientemente que agiram contra legem, como era possível castigar aqueles que nem sequer tinham as suas carreiras iniciadas? Só uma severidade doentia, repito, podia sustentar essa reacção contra aquelas criaturas, pobres inocentes que estavam justamente terminando a fase do seu aprendizado.

Nesta ironia cabe toda a criminalidade que aflige Portugal? Não, evidentemente! Este relato singular vale pelos protagonistas. E por isso, embora o mesmo não contemple todos os delinquentes, não repugna afirmar que ali se concentra boa parte deles. Na realidade, aguarda-se dos Tribunais a recta composição das lides de quem vive em sociedade. Mas se a Justiça se define por uma «constans et perpetua uoluntas ius suum cuique tribuendi»,1 e entre os preceitos do Direito chama particularmente a atenção o que manda «alterum non laedere»,2 como se há-de acreditar nalguns magistrados para cumprimento de tão elevada missão? Causará espanto, porventura, o crescimento da onda de crime e que alastre a mancha de malfeitores, quando no grémio donde se conta que saia a repressão também lá vamos dar com eles?

Decididamente, não encaixo com a reinserção num sistema de caos e provocada por um quadro de magistrados, no qual se perfilam tipos muito complexos e de duvidoso equilíbrio emocional. Enquanto for este o panorama, o meu dedo continuará a tocar na ferida.

Não há prisão que me amedronte. Ela até poderá ser um refúgio para quem, como eu, foi reduzido à miséria material pela acção infame de uns contralitigantes que depressa acharam apoio em magistrados esquecidos dos seus sagrados deveres: o meu sustento passa a correr por conta do Estado, o que virá aliviar quem me tem valido nestes tempos de aflição.aflição.3 Por outro lado, constituirá uma experiência humana muito interessante. Não sou infelizmente o único injustiçado. Muitos lá estarão penando, sem razão para isso. Com esses desgraçados estarei solidário, e levo-lhes mensagem há muito guardada: «Olhai que o inimigo não é o guarda prisional, que nos vigia enquanto dura a reclusão; nem o é quer o agente da PSP, o militar da GNR ou o inspector da PJ, que nos capturam por suspeitos. Nenhum destes elementos é o inimigo, porque o inimigo está em certos magistrados que envergam a veste talar como o actor dramático, quando sobe ao palco, se cobre da indumentária adequada ao papel que vai desempenhar em cena

Isto é o que lhes direi. E se um dia eu desistir de acusar os culpados desta vergonha, então aí, sim, estarei precisado de proceder a uma revisão do meu comportamento, a ver se me corrijo!

 

Joaquim Maria Cymbron

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  1. D. I, 1, 10.
  2. Ib.
  3. Refiro-me aos que me ajudaram com generosidade e nunca me negaram o apoio da sua amizade, quando nada me deviam nem devem. A minha gratidão não abrange certa pessoa, que é uma das principais culpadas do estado a que fui reduzido, e que persiste em não sanar o mal que também me causou. Tenho vergonha em nomeá-la e já lhe disse que recebo, a título de indemnização antecipada, o dinheiro que me envia. De resto, ela calcula (e bem) que consequências pode ter o resultado de eu me ver sem meios para sobreviver.

JMC